terça-feira, 27 de abril de 2010

Verborragia de fantasia


                                                                         Vik Muniz
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Foram oitocentas mil e quatrocentas palavras escritas, sem contar as ditas; milhões de pensamentos-desejos diários e um diário rabiscado. O amor foi censurado.

Foram canções, melodias implorando sensatez; tentando acabar com a mudez.

Foram muitos sorrisos, mendigos de um pouco de atenção. Foram dezenas de lágrimas, escorrendo desejosas de noites cálidas, e somente as noites. Ninguém pediu o dia a dia, a rotina e fantasia. Só um pouquinho de poesia noturna.

Foram cenas e tantos poemas escritos na imaginação. Será que ele vai mudar de opinião?

Palpites tolos, pois ninguém é dono do amanhã ou do tamanho da explosão que duas almas se dão. Um dia, acreditou que encontrou o refrão; no fim, não foi nem um verso da canção. Foi tudo paixão de imaginação.

O amor é sorrateiro, usa disfarces. Óbvio que na sua testa não vem escrito: "Ei, venha  fazer parte da minha festa, sou o anfitrião da sua vida!"

Tudo de muito em um pano de fundo púrpura, com direito a muita fumaça de gelo seco; pra dar efeito de sonho e irrealidade.

De verdade, do que vivi mesmo pouco existiu. Momentos etéreos e deliciosamente aéreos, acontecendo no infinito do céu.

Vivemos entre o nunca e o talvez.

 Chegaria a nossa vez?

Não sei.

Só sei que bem ou mal, já não me faz mais mal.

A finalidade concreta desta casualidade anormal, é que mesmo de costas, em linha torta e tênue, ele continua a me inspirar.

Escrevo, componho, imagino, desejo...

E não vivo, por que assim é o seu vício.

Seja bem vindo a mais um dia não vivido!

Eu prefiro ficar sempre ardendo em chama; desejando cama, colo, beijo e tudo mais que duas pessoas compatíveis possam se conceder.

E quem poderia prever? Só o tolo que acha que tem a verdade na mão; não somos donos do coração.

Agora chega dessa verborragia de fantasia. Vou viver a vida que está lá fora em algum lugar...

Já vou indo. Mas antes de correr, as últimas palavras à você caso queira dança:

Se quiser, me alcança!

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sábado, 24 de abril de 2010

Só por hoje


Vik Muniz
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Só por hoje vou dormir entre rosas;  sentir perfume carmim invadindo sentidos. 

Só por hoje não afagarei a face do amor com a palma da mão, não mergulharei nas águas límpidas e na correnteza de meu coração.

Só por hoje não chorarei incompreensão ou gargalharei dentro do seu sorriso. Não sentirei cheiro de orvalho matutino ou escutarei sibilar dos pássaros dentro de minhas ilusões.

Só por hoje não procurarei um olhar em conexão com o meu em qualquer canto das ruas cinzas.
Só por hoje não vou mais me importar com nada ou ninguém que simplesmente não se importe.

Vou correr pelas ruas cheias de poças d'água, e sentir meus passos espalhando pingos de alegria.
Vou sentir meu hálito fresco de menta e baforar no ar desmesuradamente.

Passear pelo meu sorriso, fazendo cócegas nas bochechas de risadas agudas ou graves, entoando diversos sons.

Trançar meu cabelo com elásticos coloridos, cantar alto e desafinado uma canção qualquer, cair no chão de tanto rir daquele tropeço que me fez derrubar todos os livros no chão.

Só por hoje e quem sabe amanhã ou depois de amanhã, ou depois de depois de amanhã ou a cada amanhecer ou anoitecer, ou a cada dia que viver...

Só por hoje vou  dizer, que não estou nem aí pra você ou pra qualquer coisa que não seja narcisista ou egóica.

E sem mais, num dia a mais de dor aguda, sem mais nem menos,  os meus ais todos derreteram depois do vulcão em erupção.
A lava endureceu, o pico montanhoso furioso adormeceu.

A  paz que no minuto preciso, beijou meu sorriso; voltou a brindar meus olhos cintilantes de serenidade.

Encostei no cais da tranquilidade.

Já escuto um novo chamado  do rei majestoso dourado, convidando-me a um novo trilhar.

Mas antes de seguir novo caminho, uma pausa e uma piscadela no espelho; no reflexo uma garotinha com coração serelepe e poeta, a sorrir.

Ela não cansa de repetir: só por hoje.

E de hoje em hoje, o sempre.

Pra sempre, hoje...
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segunda-feira, 12 de abril de 2010

O tapete e a fechadura

Marc Chagall

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Por debaixo do seu tapete despreendido do solo, um universo de poeira de medo se acumulava sob seus pés.
E lá estava ele, jovialmente empurrando mais poeira para debaixo de seu nobre tapete persa colorido. Ele não sorria, pois não sentia-se feliz. Mas também  não sentia-se triste. Na verdade o que ele sentia era orgulho.
Batia no peito estufado, com olhos brilhantes e ágeis ao defender suas teorias em forma de palavras soltas no ar. Lindas palavras, mas quase utópicas, quase mentirosas, que na verdade só o afastavam do portão do amor e felicidade.

Alguns aplaudiam seus pensamentos, afinal, ele se expressava com tamanha convicção e naturalidade que era  impossível questioná-lo. Ele sentia-se seguro por detrás de seu discurso "abolicionista".
Ao voltar para a casa,  ao chegar no silêncio de seu quarto, no seu mundo com sombras e luzes, ele sentia um enorme vazio, que tentava preencher em vão.

Levantava seu tapete, via a poeira acumulando, chances desperdiçadas, sonhos e ilusões misturados entres os grãos de pó.

Simplesmente ele tinha medo. Um medo feroz, mas totalmente inconsciente de se ferir pelo amor.

Para defender-se, apoiava-se em teorias, como alguém que escora num muro para não cair de cansaço.  Incessantemente buscava a perfeição, pois ele sabia que tal utopia não existia. Criava amores irreais, impossíveis, platônicos, que iam se alimentando de sua imaginação, pois assim ele sentia as inebriantes sensações da paixão e do amor, mas sem necessariamente se arriscar. Afinal, eram amores impossíveis, beirando a insensatez.
Risco era algo que ele não desejava correr. Dois pés no chão e cabeça nas nuvens, era o máximo que se permitia. Mal sabia ele, que para se encontrar o verdadeiro amor, era necessário sim despreendimento, mas o desprender-se do medo de arriscar.

De íris em íris, buscava uma que lhe cegasse. E como o amor é bicho sutil e suave, ele nunca a encontrava.
Quando batiam à sua porta, alguem de carne e osso oferecendo amor real, ele se encolhia. Se recolhia em desculpas e se auto sabotava, inventava motivos plausíveis para si e para os outros. Resistia.

No fim, permanecia entre as quatro paredes e muros de pedra que erguia ao seu redor, sua fortaleza, que o impedia de buscar os caminhos incertos e inseguros rumo ao amor...

Ela, que sem saber porque e como, espiava pelo buraco da fechadura. Ele com suas portas fechadas, não permitia-se ser tão invadido. Mas ela, o espiava. Enxergava-o varrendo minunciosamente grão por grão para debaixo de seu tapete.

Logo estaria na hora de dar às costas e partir. Mas irresistivelmente, espiava mais um pouco.

Havia meio sorriso em seu rosto, com meia lágrima caindo do lado oposto.

Adoraria abrir a porta e ajudá-lo a varrer tudo para longe.

Mas sabia que era uma escolha dele. E se assim ele o desejava, quem era ela para questioná-lo?

Observou mais alguns segundos aquela figura sentar no bolo de poeira que se acumulava. Não queria deixá-lo tão só. Mas não tinha outra escolha.

Ela o enxergava, o entendia. Mas não compreendia o fato da felicidade sempre escapar pelos dedos, quando ela se encontra tão perto, espiando pela fechadura, esperando a porta se abrir.

Dar às costas, foi tarefa árdua. Mas finalmente conseguiu, não era a primeira vez que tinha que dar adeus.

O meio sorriso de canto e a meia lágrima ainda estavam fixos em sua face.

Talvez demorariam a diluir-se.

Ela confiava no tempo e no destino.

Deu os primeiros passos e se afastou.

Caminhou até sua casa. E no seu quarto se trancou. Escreveu essas palavras. Recolheu o pranto, guardou seu manto de amor, rasgou rabiscos e rascunhos censurados, guardou o lamento e fechou os olhos na cama.

Só uma coisa não conseguiu guardar: a cor daquele olhar a perseguí-la nos seus sonhos...

Sonhou noite adentro. Foi o que lhe restou.

13/11/2009 às 00:44h

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De tanto espiar, num misto de curiosidade, fascinação e desejo, um dia encontrou a porta semi aberta.
Entrou com passos hesitantes; o aposento ainda estava semi iluminado, numa penumbra solitária.

Boca seca e coração descompassado; lá estava ele, olhando-a com olhos penetrantes, duros como facas e perfumados como flores, convidando-a para entrar, embora ainda se mostrasse desconfiado.
Frente a frente, as faces já não mais escondiam os recônditos do desejo, transbordando em beijos azulados.

Desvendaram-se juntos; a cada segundo que transcorria vertiginoso, a cada melodia descoberta, a cada poesia revelada, se descobriam um só.
Embora ele a aceitasse em seu mundo particular, persistia uma incômoda sensação de que ele a expulsaria a qualquer hora. Superando o medo, ela permaneceu sob bruma aveludada púrpura que se formou ao redor.

Ele, tão azulado, adocicado e etéreo, tingia-se de carmim intenso, a cada abraço partilhado; a cada riso fácil e em cada desejo que explodia em um beijo, nos corpos sedentos que se encaixavam.
Ela ignorava qualquer faceta da realidade externa que pudesse atrapalhá-los. E se, por breves instantes tudo não parecia fazer sentido, prendia-se no brilho daquele olhar entre sombras e luzes que lhe convidava a entrar.

Ali ficou.
Nem sabe por quanto tempo.
Quando se vive em deslumbramento mágico, o tempo se dilui e fragmenta, etéreo em seu universo; ele passa a não existir.
Cochilou relaxada com um sorriso feliz a tingir a sua face.

Sonhou.
Estava num barco navegando.
Mar.
Garoa molhando seu rosto.
Chuva.
Tempestade furiosa.
Ondas gigantes.
Naufrágio.

Acordou com a boca seca e peito irrompendo em soluços. Estava soterrada, como se estivesse debaixo de areia grossa.

Foi recuperando os sentidos lentamente. O que lhe teria acontecido?

Logo percebeu que não era sonho, naufrágio e areia.
Seu corpo estava soterrado por poeira, ele a tinha empurrado para debaixo de um tapete persa colorido.
Algo não fazia sentido e os porquês assombraram seu corpo doído, sua mente sedenta de respostas.

Chorou seu manto de incompreensão.
Muita água e sal escorria por suas faces rubras, misturadas ao pó.

Como ele poderia enterrá-la se podia jurar que ainda via o mesmo brilho do olhar em chama viva?
Embora as palavras dele estivessem carregadas de razão, de embasamentos teóricos,  no tom calmo, frio e distante; ela não tinha dúvidas.
Inexplicavelmente ela enxergava seu coração.
Era o medo, o bicho papão de suas fantasias e ilusões, rondando-o dia e noite.
Tentou sacudí-lo, abrir seus olhos.
Imóvel como uma pedra cravada no chão, ele defendeu até o fim sua falsa convicção.
Não havia mais espaço para ela.

Derrotada, pois não tinha armas para lutar com tamanho vício arraigado em sulcos profundos, ela caminhou de volta.
A revolta ainda atormentava-lhe a emoção. Quantos erros implorando perdão! Quanta vida desperdiçada em vão!

Foi uma longa viagem de volta para casa.
Chegou, exausta.
Coberta de poeira úmida, pelas lágrimas jorrando de seus olhos, ela ardia em tristeza.

Ela se jogou na água cristalina.
Enquanto se lavava, esfregava sua mente e coração implorando por alívio.

Quanto mais implorava, mais lhe vinha tormento.

A dor e a incompreensão marcavam fundo seu coração.

Fechou os olhos. Ela só queria se perder nos sonhos, se perder no esquecimento, se perder daqueles momentos que viveu ao seu lado...

Sentia arder cada parte de si; ele já estava muito enraizado em cada fragmento de seu ser estar.

No meio do turbilhão, no olho do furacão da dor, ela nem conseguiu dar final à estória.

Ficou assim, só; por dar um fim...

Ficou assim, só; com sua dor...

Ficou assim, só; tentando assassinar o que sobrou do seu amor...

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