quinta-feira, 23 de julho de 2009

Cereja em cena, boca voraz em cartaz!


Klimt


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Numa bela tarde de inverno, depois de ter ganhado o maior bolo da história, percebi que haviam me transformado em uma cereja. Daquelas bem vermelhas, bem redondas, apetitosas, daquelas que sente-se o cheiro a metros de distância.
Definitivamente, uma cereja.
Tentação para dedos ávidos e desejosos de um furto súbito, subitamente mastigando e engolindo pelo prazer da conquista a todo custo.
Ora, se uma cereja tão singular, em destaque a uma massa de bolo homogênea, pode causar tanto impacto a terceiros, por que deveria me menosprezar tanto? Da conjunção de tantos bolos, de tantas mancadas alheias, voltei a ser vermelha e fatalmente deliciosa à espreita de ser espreitada por algum voyer ansioso por me devorar.

Sim... Devorar!
Nada de mordidinhas, de economias, de pequenos acessos, de bocas pequenas com pequenezas contraditoriamente confusas. Definições práticas, com um manual prático na mão: “Como devorar uma cereja rara e faminta de ser deliciada”.

Cansei de me fantasiar de bela adormecida esperando meu príncipe acordar do pesadelo que se encontra , me beijar e caminharmos pelos contos de fada felizes! O conto de fadas, diga-se de passagem, só existiu em minha mente.

Percebi, num estalo, que apenas eu vivi um amor, e amor que é amor se vive a dois, com dois pares de olhos, duas bocas, dois corpos num só, no máximo com quatro pernas entrelaçadas dançando como cabelos de medusa. Só números pares, só a sós, só a dois, só somente um amor, chama única, infinitos beijos, suor, temperos e aromas.
Triste a constatação de que algo tão magnificamente construído, erguido com tanto desejo de concretude, seja um castelinho de contos de fada de areia, que ventos do sul, uma ventania tão impiedosa, tenha arrastado tudo consigo.
O fato é, que nem mais cutucou. Nem mais doeu. Nem mais chorei. Quando percebi que a areia estava toda no chão, fiquei olhando com um distanciamento obrigatório de quem derramou muitas lágrimas a construir pedra por pedra. Uma bruxa má que transformou minerais em areia.
Fiz um pacto com a felicidade. Disse a ela; que expulsei a tristeza pra “far far away”, e daqui pra frente só ia querer quem me quisesse, e já que em troca de tanto amor me deram um enorme bolo, eu viraria a cereja na vitrine ofertada ao primeiro que quisesse devorar-me com dignidade.
Precisamos ás vezes nos ansiar, caminhar em nossas entranhas, lamber nossas vísceras para então finalmente percebermos que tamanha delícia não merece ser desprezada assim sem mais, menos, divisão e multiplicação. Que a nossa porcentagem é absurdamente maior que a raiz quadrada do número mais elevado que conseguimos calcular, e que temos nosso imenso valor!
Portanto, meu anúncio a quem quer devorar-me:

“Uma bela cereja, tristemente solitária em cima de um enorme bolo, o maior que já tive, procura um devorador com um enorme apetite, com um estômago grande, vazio e ávido de uma pequena e apetitosa cereja que irá preencher todos os espaços devidamente, uma mutante, que se transformará na mais farta e nutritiva refeição que seu organismo necessita. Mas atenção: Se o apetite não for muito voraz, nem pense em tocar nesta cereja, que pode se transformar num espinho de rosa, e ferir sua garganta ao passar.”

Impiedosa, como impiedosamente me devoraram com pouca avidez, com belas palavras amorosas tão vazias de atitudes e concretude.

Felicito-me, feliz de estar felicitando a felicidade definitivamente!
E continuo tão apetitosamente ansiosa por ser devorada. Minha maior dádiva é essa. Ao ser engolida consigo exprimir toda a minha delícia, minha textura, meu aroma, meu sabor tão próprio, tão meu, tão mel, tão fel e tão eu!

Eu...Sem querer ser mais que ninguém, apenas eu, mas o eu mais inesquecível que poderia ter passado na sua boca. E sei que quando voltar a amargar o gosto amargo da desilusão, lembrará daquele gosto catártico...

Estarei em outra boca...

Desculpe-me. Não podia esperar tamanha boca fechada se abrir, sem que ela escancarada me mantivesse presa e suculenta, sussurrando insistentemente e verborragicamente o quanto ansioso estava pra me devorar, me comer, se deliciar, o quão seu apetite era vorazmente gigantesco e sublime.
De tão pouca gula, de tão inexistente ronco como sinais de fome, fui convencendo-me que não podia ser uma pílula para abrir apetite. Era apenas eu mesma, tão única e desejosa de você, passando tão desapercebida !

Convenci-me então. E resolvi , sem tristezas nem apegos, a ouvir meu próprio rugido no estômago. Estou apetitosa de desejos sinceros de amor. Faminta.

Faminta de amor. Faminta de amar.

Boca faminta, venha, devorar-me, pra que eu, tão faminta de amor, possa devorar-te!
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Um comentário:

  1. Artilharia pesada à cereja.

    Começa a festa, todos disfarçando com seus copos na mão e sorrisos, mas ninguém esconde, a espectativa é a hora do bolo, pra pegar a cereja.

    As horas não passam, todos os convidados já chegaram, mas o grande momento não chega. alguns desistem, outros fazem apostas, todos concordam que quem conseguir o pedaço de bolo com a cereja será o grnade vitorioso, será o grande campeão, que poderá ser batido apenas numa próxima festa.

    Chegada a hora, após um interminável "parabéns pra você" aparece o bolo, mas...
    - onde está?
    - cadê a cereja?
    - quem comeu?
    -onde foi parar?

    Correria por todos os lados e nada, onde foi parar a bichinha.

    - você sabe onde está?
    -Eu sei, disse!
    - mas onde?
    -Fugiu, afirmei!
    - pra onde? me perguntaram?
    Ninguém sabia ou se deram conta, que esta cereja, além de vermelhinha e suculenta, tem um grande coração.
    - foi procurar que lhe mereça, eu disse...

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